Seja por meio do contato direto com os animais silvestres ou por desequilíbrios causados pelas alterações ambientais, surgem cada vez mais doenças de origem animal
Pandemia. Coronavírus. Covid. Você já parou para pensar a dimensão que essas palavras, que até há pouco tempo eram desconhecidas para boa parte da população mundial, passaram a ter na nossa vida? E mais: o quanto tivemos de mudar nossa rotina para não adoecer? Por meses, estamos convivendo com um fenômeno que está matando muita gente.
Parece que, de repente, o mundo ficou de pernas para o alto.
Mas será que foi tão de repente assim? Vamos refletir um pouco...
Das quase 1.500 doenças que acometem os seres humanos, aproximadamente 60% são causadas por microrganismos capazes de se desenvolver em seres vivos de diferentes espécies. Nos últimos 30 anos, aproximadamente 75% das doenças infecciosas descobertas e que enfrentamos tiveram origem em animais, não humanos. Ou seja, não é de hoje que a nossa saúde está bastante ligada com as outras formas de vida que dividem o planeta com a gente.*
E a Covid-19 é parte desse contexto. Você se lembra, lá no início da pandemia, quando os pesquisadores afirmaram que o novo coronavírus contaminou pessoas em um mercado que comercializa animais selvagens vivos e abatidos na cidade de Wuhan, na China? Pessoas que frequentavam esse local acabaram expostas ao vírus e ficaram doentes. Eles foram os primeiros humanos a se contaminar com um microrganismo que poderia ter ficado restrito ao universo da fauna silvestre, caso a população não tivesse o hábito de capturar animais ou se alimentar com a carne de espécimes retirados da natureza.
Para não parecer que estamos falando de atitudes distantes da nossa realidade, de gente de lá do outro lado do mundo, vamos a um exemplo mais simples. A raiva. Quem não conhece essa doença, também transmitida por um vírus, que nos obriga a vacinar todos os anos nossos cães e gatos para evitar que eles sejam infectados e que também acabem nos contaminando? No Brasil ainda tem gente que morre pela infecção do vírus da raiva, principalmente por manter pequenos saguis capturados na natureza como animais de estimação. Há relatos em estados do Nordeste da perda de vidas humanas, inclusive de crianças, que foram mordidas por esses pequenos animais contaminados pelo vírus.
O risco de contrair doenças por criar como animal de estimação um animal silvestre traficado envolve também papagaios e araras com a psitacose, enfermidade pulmonar que pode matar, e répteis como os jabutis com a salmonelose – para citar apenas alguns dos animais mais apreciados pelos brasileiros. Ter espécime silvestre como mascote envolve ameaças à sua saúde e você tem que saber disso.
Assim como acontece na Ásia e em outros locais, muitos brasileiros também gostam de caçar e acabam correndo riscos ao se alimentar da carne de animais selvagens. Os tatus, por exemplo, que são bastante procurados por quem pratica essa atividade ilegal, podem transmitir hanseníase, leishmaniose e doença de Chagas. E o perigo não está somente em comer o animal, mas envolve os atos de caçar ou de criar em cativeiro.
Lugar de animal silvestre é na natureza, longe de situações de maus-tratos e contribuindo para a manutenção do equilíbrio de seu habitat. Se os ecossistemas permanecem saudáveis, evitamos problemas com muitas doenças. Agora, se a caça, o tráfico de animais e os desmatamentos continuarem, vamos enfrentar mais surtos, epidemias e, por que não, novas pandemias.
Além de colocarmos em risco as nossas vidas e de nossos amigos e familiares, vamos sobrecarregar o já problemático sistema de saúde e aumentar ainda mais os gastos do poder público com o tratamento de doentes e o combate a enfermidades que poderiam ser facilmente evitadas: basta deixar os animais silvestres na natureza!
Não guarde essas informações com você. Passe adiante, compartilhe com sua família, colegas e amigos. Só com o envolvimento de todos nós é que poderemos reduzir a transmissão de muitas doenças e as chances de novas pandemias acontecerem.
*AMERICAN VETERINARY MEDICAL ASSOCIATION, 2008; TAYLOR et al., 2001
*AMERICAN VETERINARY MEDICAL ASSOCIATION. One Heath: A New Professional Imperative. Disponível em: < http://www.avma.org/onehealth/onehealth_final.pdf>. 2008. 71 p.
*TAYLOR, L.H.; LATHAM, S.M.; WOOLHOUSE, M.E. 2001. Risk factors for human disease emergence. Philosophical Transactions of the Royal Society of London: Biological Sciences 29;356(1411): 983-9.