Quem ama e quer a proteção dos animais deve ser um aliado na luta dos indígenas pelos direitos aos seus territórios
Eles são menos de 5% da população no mundo, mas são responsáveis pela proteção de mais de 80% da biodiversidade do planeta. Mesmo assim, ainda continuam tendo os direitos, bem como a sua própria segurança, ameaçados e violentados.
Desde o dia 22 de abril até esta sexta-feira (26), mais de 6 mil indígenas se reuniram em Brasília para a 20ª edição do Acampamento Terra Livre. Neste encontro, povos de mais de 180 etnias discutem questões políticas, sociais e culturais em reuniões, conferências e manifestações. O tema central deste ano é: “Nosso marco é ancestral: sempre estivemos aqui”. Essa reafirmação é necessária para rejeitar a teoria do Marco Temporal, que determina que indígenas só podem reclamar a posse de suas terras se estivessem ocupando-as na época da promulgação da Constituição Federal de 1988. Ela ignora que muitas comunidades foram expulsas de seus territórios. Mesmo assim, ela busca ser validada pelo Congresso Nacional, especialmente a bancada ruralista, ainda que já tenha sido julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Nós da Proteção Animal Mundial apoiamos a luta dos povos indígenas pelo direito aos seus territórios como uma luta pela conservação dos nossos biomas.
No Brasil, as terras indígenas foram responsáveis por apenas 1% de todo o desmatamento registrado entre 1985 e 2022, segundo o Mapbiomas. A maior parte dessa fração da destruição foi ocasionada por atividades ilegais de invasores, como o garimpo e a grilagem de terras. Por outro lado, no mesmo período, perdemos 15% das nossas florestas. Quase a totalidade (95%) do desmatamento aconteceu na conversão para atividades agropecuárias, especialmente a produção de commodities como soja e carne. O problema é que essa perda de habitats é hoje a maior ameaça para a biodiversidade brasileira depois das mudanças climáticas. Por isso, defender a demarcação de terras indígenas é defender a biodiversidade, e assim ampliar a proteção à nossa fauna.
No momento em que o mundo passa a reconhecer o potencial estratégico da nossa biodiversidade para a bioeconomia, os povos indígenas continuam a nos dar lições sobre como mudar nossa atitude em relação ao meio ambiente. Para eles, os animais não humanos não são coisas ou “recursos naturais” a serem explorados economicamente, mas seres que merecem respeito e direitos pela profunda relação de interdependência que possuem conosco, os animais humanos.
Os bichos expressam a sabedoria da natureza, e isso é parte da cultura indígena, na sua relação íntima com a floresta. Tanto de forma objetiva e material, como no artesanato que se inspira nas aves, na onça, no tamanduá, nas cobras, no tatu e em muitos outros, como de forma imaterial, nas fábulas e histórias que usam as qualidades desses animais para ensinar sobre força, coragem, esperteza, generosidade, paciência, resistência, humildade, e que alimentam sua espiritualidade. Não à toa, em muitas falas durante o Acampamento Terra Livre, plantas e animais são saudados como irmãos, pois não são diferentes ou menores do que os “parentes”, como são chamados os indígenas de outras etnias. “Antes de reflorestar hectares, precisamos reflorestar mentes”, afirma a liderança indígena e deputada federal Célia Xakriabá, em referência ao movimento da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga).
Represnetantes de comunidades indígenas defendem a biodiversidade em Brasília durante o Acampamento Terra Livre, reafirmando seus direitos ancestrais e lutando pela demarcação de terras.
Assim como na luta mundial para conter o avanço das mudanças climáticas, os povos indígenas são também parte da solução para recuperarmos os habitats dos quais dependem a nossa fauna silvestre e interromper a grande extinção de espécies que já está em curso. Por isso, a luta pelos direitos indígenas é a luta pelos animais, e pedimos que ela também seja sua. Na sabedoria da mãe natureza, toda vida importa. Por isso, junte-se a nós para defendê-las.
Fotos: Ester Cruz