COP 28 fracassa ao não incluir a pecuária industrial nas negociações sobre alimentação e agricultura, afirma Proteção Animal Mundial
Comunicado de imprensa
ONG também considera preocupante que o Roteiro da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura não mencione a agroecologia como solução para a questão climática
A Proteção Animal Mundial, organização não-governamental que há mais de 70 anos atua em prol do bem-estar animal, avalia que a COP 28 falhou ao não incluir a pecuária industrial, atividade de imenso impacto no clima, na pauta de sistemas alimentares.
“Somente no Brasil, os sistemas alimentares representam 74% das emissões de gases de efeito estufa, segundo dados do Observatório do Clima. Os danos da pecuária industrial não incluem apenas as emissões do próprio rebanho, mas, principalmente, o desmatamento no território brasileiro. Lamentamos profundamente que o lobby desta indústria tenha conseguido, mais uma vez, dar as cartas na principal conferência climática do mundo”, critica Marina Lacôrte, gerente de sistemas alimentares na Proteção Animal Mundial.
Marina destaca que as propostas de modificação genética de animais e o uso de aditivos alimentares para redução de metano são alarmantes.
“O agronegócio mandou para COP um verdadeiro exército de representantes para defender os próprios interesses, ou seja, embora escandaloso não é surpresa o setor apresentar falsas soluções para o problema e com ainda mais impactos no bem-estar animal. Essas medidas não contribuem efetivamente para solucionar a questão da produção alimentar no clima e são ineficazes. O que precisa ser encarado de uma vez pelo setor é o desmatamento gigantesco que suas atividades ainda causam em biomas preciosos do Brasil, incluindo a produção de grãos para a ração que alimenta os animais. Não dá para a pecuária industrial continuar se expandindo infinitamente, isso é inconciliável com as ações que temos que tomar para garantir um planeta saudável”, afirma Marina.
A Proteção Animal Mundial considera também preocupante que o Roteiro da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura exclua a agroecologia.
“Em vez de continuar dando subsídios como crédito rural, isenção fiscal, entre outros mecanismos, para o agronegócio, os governos deveriam destinar esses benefícios para as produções em menor escala e para a agricultura familiar. O que vimos na COP 28 foram incentivos que acabam sendo destinados para os mesmos grandes atores de sempre, mais interessados em lucrar do que contribuir positivamente com a pauta climática”, destaca Marina.
Sobre a Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática, assinada por mais de 150 países, a organização destaca que o documento não inclui nada sobre uma transição justa para sistemas alimentares que reduziriam as emissões prejudiciais de gases com efeito de estufa produzidos pela pecuária industrial.
“Esses documentos precisam ser taxativos e trazer total clareza do que significam os caminhos que devem ser tomados. Nesse sentido, o texto deveria mencionar a agroecologia como alternativa e solução, bem como a necessidade de um aumento na diversidade das dietas baseadas em alimentos vegetais. Afinal, é exatamente isso o que precisamos: sair cada vez mais desse modelo e migrar para sistemas justos e sustentáveis, cuidando da natureza e dos animais e valorizando escalas menores e pequenos agricultores”, pontua Marina.
COP 30 em Belém
Um compromisso estratégico na declaração dos Emirados Árabes Unidos sobre agricultura sustentável é que os países precisarão incluir alimentos e agricultura em suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) até a COP30, que será realizada no Brasil em 2025.
“É essencial que esse compromisso seja cumprido. Precisamos redobrar esforços para garantir que estas declarações sejam traduzidas em ações concretas. Esse é um desafio e tanto para o atual governo, que apesar dos esforços visíveis ainda tem cedido muito para o setor do agronegócio, especialmente no congresso. É preciso entender que o que está em negociação é o futuro da floresta, dos animais, das pessoas e do planeta.”, afirma Marina.
A Proteção Animal Mundial continuará a trabalhar com governos, instituições, sociedade civil e setor privado pela transformação nos sistemas alimentares.
Na COP 28, a ONG, em parceria com a ProVeg International e a Upfield sediou o Pavilhão Food4Climate, onde uma ampla gama de representantes das sociedades privadas e civis se uniram em defesa da transformação dos sistemas alimentares para beneficiar as pessoas, os animais e o planeta.
Clima e bem-estar animal
Para além de todo o sofrimento causado em animais de fazenda no sistema industrial, o plantio de soja para produção de ração é o que vem promovendo a maior parte do desmatamento em biomas importantíssimos como o Cerrado e a Amazônia, impactando também o habitat da vida silvestre.
“Sempre que um animal silvestre morre, parte do bioma que ele habita morre junto. Isso porque a vida silvestre desempenha um papel estratégico na manutenção e no equilíbrio das florestas e vegetação nativa por meio de ações como a dispersão de sementes, polinização, predação, entre outros. A soja que vem devastando a vida silvestre é usada, principalmente, para compor a ração de porcos, galinhas e bois, animais que levam uma vida miserável e são tratados como meras mercadorias, ou seja, não há nada de bom nesse sistema, seus impactos são gigantes e diversos”, argumenta Marina. “Os animais de granja e fazenda são seres vivos que sentem e merecem uma vida digna, algo impossível de se ter na pecuária industrial. Por isso, o bem-estar animal também é um indicador de sistemas mais sustentáveis, mais justos e que contribuem muito menos para as mudanças climáticas”, complementa Marina.